Data da postagem: 01 Março 2007
A crescente dose especulativa que contagiou a escalada das cotações internacionais de milho e soja já começa a desnortear analistas tarimbados em prever, com base em fundamentos, o comportamento desses mercados.
Com o aumento da participação de fundos de investimentos e especuladores na movimentação de papéis das duas commodities na bolsa de Chicago - em parte por conta da "febre" americana em torno do uso do etanol de milho como combustível - fatores que antes tinham peso mais restrito, como as oscilações do petróleo, ganharam importância, enquanto outros que costumavam guiar os preços, como produção e estoques, enfraqueceram-se.
É o que explica a outrora inexplicável forte valorização da soja em fevereiro. Com produção recorde na América do Sul e gordos estoques americanos e mundiais, era de se esperar uma certa perda de sustentação, mas, segundo cálculos do Valor Data, o grão registrou a maior alta entre as oito principais commodities agrícolas transacionadas pelo Brasil no exterior no mês. As contas são baseadas nas médias mensais dos contratos de segunda posição de entrega (normalmente os de maior liquidez) de produtos negociados em Chicago e Nova York.
Em Chicago, a cotação média da soja alcançou US$ 7,7268 por bushel no mês passado, 8,71% acima da média de janeiro. Com o novo salto, os ganhos acumulados em 2006 chegaram a 14,12%, e a 29,52% nos últimos 12 meses. O suporte para a valorização segue vindo das perspectivas de perda de terreno para o plantio de milho nos EUA, mas o atual balanço de oferta e demanda americano e global ainda aponta para uma situação confortável.
"A comoção mundial em torno do etanol continua alimentando uma tremenda especulação. Nesse contexto, podemos esperar, para os próximos 60 dias, tanto disparadas quanto tombos. Trata-se de um momento delicado, no qual 24 horas podem ser consideradas longo prazo", resumiu Antonio Sartori, da corretora Brasoja.
Já com a relação entre estoques e consumo apertada, tanto nos EUA quanto no mundo, o milho também permaneceu em alta em fevereiro, impulsionado principalmente pela onda do etanol e pelas perspectivas para a próxima safra americana (2007/08). Nos critérios do Valor Data, a cotação média do produto alcançou US$ 4,2353 por bushel no mês, 5,45% mais que em janeiro. No ano o salto atingiu 11,37%, e nos últimos 12 meses, 81,36% - a maior entre as commodities pesquisadas.
"Com o quadro atual, até a preocupação com o clima nos EUA para o plantio da safra 2007/08 já começou", afirmou Leonardo Sologuren, da Céleres. O analista concorda com a forte dose especulativa no mercado, e lembrou da influência chinesa na queda das cotações do milho na terça-feira em Chicago - para ele pouco mais que um pretexto para ajuste de posições. "O problema é que, há dez anos, a China respondia por 3% das importações globais de grãos, e hoje o percentual chega a 11%".
Um pouco menos contaminado pelas especulações, o trigo registrou a menor variação em Chicago em fevereiro. O preço médio do cereal atingiu US$ 4,7883 o bushel, em alta de 0,07%. Segundo Flávia Moura, da Fimat Futures, neste caso a sustentação veio da melhora climática nos Estados Unidos, que deverá facilitar o escoamento dos grãos naquele país.
Em Nova York, fevereiro foi marcado por quedas, aqui também guiadas por movimentos especulativos e realização de lucro por parte dos fundos, segundo analistas ouvidos pelo Valor. No caso do café, as vendas dos países produtores, sobretudo Brasil e centro-americanos, ajudaram a pressionar as cotações, segundo Rodrigo Costa, também da Fimat. A cotação média encerrou o mês a US$ 1,1845 a libra-peso, em queda de 3,23%. E a expectativa é de que a pressão sobre continue no curto prazo.
Já o suco de laranja alcançou, em média, US$ 1,9116 por libra-peso, em baixa de 2,87%. "Os preços foram influenciados pelo movimento baixista das commodities em geral", disse Michael McDougall, da Fimat. "Boa parte dos fundos aproveitou os últimos dias do mês para realizar lucro".
O mesmo aconteceu com o açúcar, que em fevereiro ficou em 10,57 centavos de dólar por libra-peso, com desvalorização de 4,11% sobre janeiro. "Os fundamentos para o açúcar ainda continuam os mesmos [superávit global para 2007/08]", afirma Alexandre de Oliveira, outro analista da Fimat.
No algodão, a queda das exportações americanas deu o tom baixista, e a cotação média da pluma ficou em 53,34 centavos de dólar por libra-peso, recuo de 3,54% no mês em relação a janeiro.
E o cacau foi a única commodity que subiu em Nova York "O escoamento da safra de cacau da Costa do Marfim está normal", diz MacDougall. Os preços futuros médios do cacau em fevereiro fecharam a US$ 1.740,42 a tonelada, com alta de 5,98% no mês, conforme o Valor Data.